Fábio B. Salvador
04/12/2018 | Crônica de quatro falidos
Cláudio era um jovem determinado. Liberal, convicto do valor do trabalho e do empreendedorismo. Usava camisa polo e calça jeans de marca. Ia a conferências e ao Fórum da Liberdade. Havia lido “Pai Rico, Pai Pobre” na adolescência. Naturalmente, resolveu abrir uma empresa de consultoria. Alugou uma sala em um endereço elegante e movimentado, fez uma bela inauguração e contratou uma agência para criar uma imagem institucional.
Gastou tanto iniciando a empresa que viu-se em apuros quando o fluxo de caixa inicial não correspondeu a suas expectativas (“mas como, se o plano de negócios estava embasado em estudos sólido do mercado?”). Além disso, esforçava-se em manter seu estilo de vida intacto, tendo dinheiro disponível ou não.
Romulado, bem diferente, reduziu seus gastos para encarar o desafio de empreender. Montou a própria hamburgueria. Na estreia, casa lotada. Depois, clientela minguada. Irritado, chamou um consultor e ouviu suas opiniões bem embasadas sobre o mercado local. Poderia ter economizado a grana e escutado um de seus garçons: “pô, com hambúrguer a vinte contos, quem vai comer aqui?”
Ora, se os valores da casa eram altos, era porque os custos também o eram. “Não é possível baixar os preços”, pensava Romualdo. Ele talvez ignorasse o fato de que, a duas quadras dali, outro estabelecimento conseguia servir oferecer preços quase 30% menores. “Ah, mas nós temos o nosso diferencial...”, dizia, antes de enumerar uma série de “vantagens” abstratas com as quais ninguém se importa.
Diferente dos outros dois, Roberta entrou para o mundo empresarial vinda de baixo. Era sub-gerente de uma grande loja de móveis até o dia em que a unidade fechou. O seguro-desemprego seguraria as pontas até que o negócio, aberto com o FGTS, prosperasse. E assim nasceu a Beta Móveis, em um imóvel de aluguel modesto em um bairro da capital.
Logo ficou evidente que Roberta abrira sua empresa por gostar de móveis e pelo desejo de ter a própria loja – seu público-alvo era ela mesma, sua missão empresarial, a satisfação das próprias inclinações e fantasias. Os clientes? Estes não entraram no cálculo. Aliás, de fato quase não existiam.
Distante desta triste história de negócios recém-abertos, Oto comandava uma loja de ferragens tradicional na cidade. Seu avô a havia fundado, passando para seu pai, que agora dava-lhe o lugar. As coisas, no entanto, iam mal: lojas grandes ligadas a redes de abrangência regional e até nacional haviam tomado o mercado.
Reunia-se com outros colegas de infortúnio na associação empresarial local, uma espécie de “universo” no qual os ex-grandes da cidade ainda podiam sentir-se importantes. Associação, diga-se de passagem, solenemente ignorada pelas firmas gigantes vindas de fora, e que mantém sua cada vez menor relevância dando comendas a políticos e outros possíveis “influentes” das redondezas.
Os quatro, Romulado, Cláudio, Roberta e Oto, passam hoje boa parte dos seus dias pendurados no celular, buscando alguma distração da realidade. Perguntam-se se poderiam ter feito algo diferente. Não! Não poderiam! Os quatro creem ter feito tudo certo! A culpa é exclusivamente do sistema, da competição desleal, do ambiente de negócios que não existe no Brasil!
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