Erner Machado
15/06/2018 | O Povo do Viaduto Otávio Rocha.
Conheci o Viaduto da Borges de Medeiros, em 1969 quando vim de Rosário do Sul a Porto Alegre, para inscrever-me no Concurso Público do Banco Amazônia S.A. que, naquela época, ficava à esquerda de quem sobe a Borges vindo da Rua da Praia.
Impressionou-me a magnitude daquela obra de arquitetura cuja construção foi decidida quando o Intendente (prefeito) da Capital era o dr. Otavio Rocha e o presidente do Estado o dr. Antônio Augusto Borges de Medeiros.
Foi entregue à população em 1932. Fiz este pequeno histórico para dizer que acabei passando no Concurso do Basa, onde fui admitido em 26 de novembro de 1970. Desde então, até 2009 quando saí de Porto Alegre, a Borges de Medeiros e o seu Viaduto passaram a ser roteiro diário de minhas caminhadas e paisagens líricas de meus olhos.
Os anos de permanência na geografia da cidade foram danificando o exterior do viaduto, suas alvenarias e suas pinturas... até que no segundo governo de Tarso Genro, como prefeito da Capital, entre os anos de 2000 e 2001, foi totalmente revitalizado permitindo que a população o contemplasse em todo o seu resplendor.
As lojas e o bares de seu interior foram totalmente reformados e integrou-se, novamente, pela beleza de sua arquitetura à vida cotidiana da cidade.
Não raras vezes enquanto tomava uma pura , junto com os meus colegas Valter, Adroaldo, Marçal, Michel e Flavio Schneider, em uma mesa do bar do Português, no número 900 do Viaduto, foi-nos dado apreciar grupos de turistas que vindos do Hotel Everest e de outros Hotéis tradicionais da Capital, serem conduzidos por guias e examinarem encantados, cada detalhe ,da monumental obra de arquitetura.
Por tudo isto sou tomado de enorme tristeza por saber que, hoje, o Viaduto da Borges de Medeiros perdeu seu encanto, sua poesia, sua beleza, suas lojas e seus bares e deixou de ser objeto e admiração e encanto para transformar-se em uma pensão ao ar livre, cujos cômodos são feitos de cobertores que formam um ângulo de 45 graus que, partindo da pares chegam até ao chão.
E este cômodos, singulares, servem de moradia e lar para centenas de seres humanos que, ali, dão vazão aos seus dias e às suas vidas... se alimentando, fazendo sexo, provendo suas existências a partir de pequenos furtos aos que se aventuram por aquelas passagens ou em comércios e transeuntes da Gerônimo Coelho, da Fernando Machado ou da velha Duque de Caxias.
E aquele trecho da Borges de Medeiros tem atividade dia e noite e os poucos que dormem o fazem sob o efeito de álcool, de crack , cocaína ou outras drogas, como única forma de acalmar as tempestades dos mares revoltos de suas mentes.
Este povo- que habita o viaduto- é composto mulheres e homens , jovens, maduros e velhos maltrapilhos...desdentados, doentes e fracos. Tem em comum a situação de pobreza extrema que, por mais exposta que esteja, não sensibiliza as pessoas que tem obrigação de lançar um olhar para os miseráveis de todas as sortes, e que com este olhar pudessem aliviar suas dores, suas angustias, seus males e dando um novo sentido às suas vidas através projetos responsáveis e consequentes.
Estão ali e ali ficarão, até que morram de doença ou se matem , entre si pela disputa de um punhado de droga.
Quando morrerem ou se matarem, serão enterrados em cova rasa cuja cruz, se houver, não terá nome...mas pela morte, o número de miseráveis não diminui pois o que partiu é substituído por outro corpo, sem alma, que ocupa o seu lugar.
Ao vê-los mesmo que de longe, sou levado a me lembrar do Jaime Caetano Braum, que ao definir os pobres da Pampa Gaúcha os chama de: “Os miseráveis dos Galpões e os Párias das Solidões”
O povo do Viaduto é miserável e se assemelha aos párias das solidões descritos pelo Jaime pois, igual a eles perdeu todo o pouco, de material que tinha, e junto com suas perdas perdeu o rumo da vida e perdeu o sentido de lutar por sobrevivência ou por dias melhores, para si e para os seus.
São, finalmente, um quadro em miniatura dos homens, mulheres e crianças pobres do mundo e que trazem em cada rosto, um certo ar de tristeza que eu nunca pude explicar...
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