Mafalda Orlandini
12/01/2015 | De repente, 85 anos
Em novembro, encontrei na Revista Donna uma entrevista com o famoso cirurgião plástico Ivo Pitanguy. Sou grande admiradora dele pelo sucesso profissional e pelo seu comportamento social. É, sem dúvida, um brasileiro admirável e, ao ver que era questionado pelos seus 88 anos, lancei-me com curiosidade à leitura. Tinha certeza de que iria encontrar lições de vida além de conhecer sua biografia.
“Acho muito importante festejar a vida, festejar os momentos de vida. Isso ajuda a viver”. Primeira lição. E diz também: o mais importante é chegar nesta idade, ter lucidez, entender o sentido da alegria de viver, ter uma sensação de poder, de dominar sua vida.
É assim que me sinto aos 84 anos, mas está-se aproximando o que costumam chamar de inferno astral, semanas antes do aniversário das pessoas. O meu inferno não é cheio de coisas ruins, mas me deixa ansiosa. É pela passagem dos festejos de fim de ano. Já não se pode mais reunir toda a família porque já é muito grande, há outros clãs agregados, alguns até espalhados pelo mundo. Outros já nos deixaram e vêm as saudades. E há também a escolha dos presentes: a quem presentear, não esquecer ninguém, dar o mimo certo.
Outras vezes, leva-se um susto, quando se pensa que são 85 anos que passaram como um corisco no céu. Começa-se a pensar em milhões de coisas, passagens boas ou más, situações que se tornaram lições de vida. Daí eu penso em minha profissão. Será que deixei marcas positivas por onde passei?
Minha família em um almoço no extinto Fogo de Chão.
Comecei na Vila Nova em 1966, num casarão muito velho, com alunos muito humildes, com chinelos de dedo e tremendo de frio no inverno. Lecionei em Cachoeirinha, onde encontrei alunos de idades diferentes. Os da tarde e os da noite porque trabalhavam de dia. Pela manhã, era no Colégio Rosário. Ali, na segunda série do Segundo Grau, lecionei para adolescentes filhos de empresários, de artistas, de políticos, de jornalistas, de deputados, do governador. No final, antes de me aposentar, vim para a Vila Assunção. Tínhamos crianças que moravam nas mansões da Vila e filhos de pescadores da beira do Guaíba. Isso tudo significa que, como professora, convivi com estudantes das mais diferentes classes sociais. Todos foram iguais na sua individualidade, pessoas dignas do mesmo tratamento, da mesma atenção e do mesmo carinho. Só uma vez fui inflexível com um aluno que reprovei por não estudar durante todo ano. Seus pais descobriram meu endereço e vieram me oferecer um contrato de aulas particulares durante um ano se o aprovasse. Foi a única vez que tentaram me corromper. Avaliando minha vida, acho que cumpri honradamente minha missão.
Meus queridos netos, Ricardo e Milena, pais dos meus bisnetos Pedro e João, que não vieram ao aniversário da bisa porque não havia espaço para tanta peraltice.
Sinto emoção e orgulho ao falar de minha família: dois filhos, quatro netos, uma neta, dois bisnetos. Pequena, é claro, mas sujeita a crescer pelos casamentos ou nascimentos. Como agora fico mais tempo em casa, recebo muitas visitas e, seguido, me buscam para passear, almoçar ou festejar qualquer evento. Todos muito carinhosos, me cuidam com respeito e me tratam como eu gosto de ser tratada, como se fosse uma irmã, uma companheira da mesma idade, não uma senhora idosa, meio fora de moda, parada no século passado.
Milena, Iane, Eu, Ricardo e Fernando.
Agora, no dia 7 de janeiro, festejamos juntos os meus bem-vividos 85 anos, de uma maneira fraterna, descontraída. Somos iguais e diferentes e nos respeitamos como tal. Há apenas um ponto comum, que faço questão de ressaltar: a mulher que os educou e os manteve unidos nos princípios do bem e da honestidade. Não discutimos o Deus de cada um, o time de preferência, as ideias políticas ou outros gostos individuais. Aprender a respeitar suas próprias limitações é o meu orgulho e o meu o segredo, e poder transformar cada momento no prazer de estar usufruindo as benesses que a inteligência do homem cria a cada dia. Afinal, estou viva e feliz. Para encerrar, vou plagiar e reforçar um pensamento de Pitanguy: “Envelhecer é uma glória reservada a poucos.”
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