James M. Dressler


26/06/2014 | Reforma Trabalhista

Outra reforma que eu nem diria que está engavetada, mas que simplesmente sequer passa pela cabeça de nossos governantes é a reforma trabalhista. A resistência que existe, tanto por parte de sindicatos, como por parte dos trabalhadores em geral, impede qualquer movimento neste sentido. Se já temos protestos variados pelo país atualmente, a simples menção do desejo de uma reforma trabalhista por parte do Congresso Nacional faria o país vir a baixo.

Mas por que eu vejo esta resistência, baseado em que fatos tiro essa conclusão? Um dos motivos é que no estado brasileiro sempre houve uma espécie de fúria legislativa, herdada de nossos colonizadores, e que naturalmente também se estendeu ao âmbito do trabalho. Não bastasse isso, ainda importamos uma legislação trabalhista italiana que, à época, já era bastante complexa para o nível de desenvolvimento que nosso país atravessava. Foi um avanço, mas digamos que foi uma dose forte demais: num momento não tínhamos nenhum conjunto de leis regulando as relações de trabalho, e no seguinte tínhamos um que regulava mais do que países muito mais adiantados que o nosso. Outro motivo, mais cultural, é que no Brasil se tende a ver o trabalho como um fardo, como um “jogo” entre “explorado” e “explorador”, e então, para aliviar o “peso” que cairia sobre os trabalhadores, seriam necessárias uma série de leis que regulassem as relações de trabalho, aliviando a pressão e equilibrando o “jogo”.

O fato é que chegamos a um ponto em que “virou o fio”: há regras demais, regras que engessam a economia, que atrapalham os negócios e a vida dos próprios trabalhadores (mesmo que a intenção original fosse a oposta), geram custos enormes e encarecem de tal forma os produtos, que perdemos oportunidades de exportar o que produzimos internamente. O resultado é desastroso: (1) empresas brasileiras deixam de ser criadas, o que resulta em não criarmos novas tecnologias e ficarmos sempre a reboque das nações desenvolvidas; (2) empresas estrangeiras deixam de se instalar aqui no país, preferindo importar produtos prontos para o Brasil; (3) sequer conseguimos agregar valor aos produtos primários produzidos aqui dentro, e passamos apenas a exportar “commodities” para logo em seguida importá-las como produtos industrializados lá fora.

Mas o que basicamente esta reforma deveria abranger? Deveria haver uma progressiva desregulamentação nas relações trabalhistas, permitindo jornadas de trabalho flexíveis, dependendo da ocupação do trabalhador e firmadas em contrato de trabalho, temporários ou não. O conceito de aviso-prévio também deveria ser revisto, podendo, num primeiro momento, haver uma redução de um mês para quinze dias. Desejável seria o fim da multa de FGTS por demissão sem justa causa, e uma redução de desconto para o FGTS ou mesmo sua extinção gradual. Outra modernização que seria extremamente salutar seria o fim das contribuições compulsórias para sindicatos. O direito de greve também precisa ser revisto, melhor regulado (principalmente no serviço público), para não expor a população às situações que temos visto nos últimos anos, em que acabamos reféns de grupos organizados de trabalhadores, que detendo uma posição estratégica, submetem os demais às exigências mais absurdas, obtendo vantagens que nenhum outro trabalhador consegue. Num país em que falta mão-de-obra, com uma economia formal bastante organizada, isso não faz o menor sentido. Há sempre uma alternativa para quem não está satisfeito com seu salário atual ou as condições de trabalho: procurar outro emprego. E com as alterações nas leis trabalhistas já sugeridas, fará menos sentido ainda.

Alguém poderia argumentar que isso seria um enfraquecimento da posição do trabalhador, que ficaria desprotegido perante o “poder do capital”, e que não teria proteção no caso de demissão. Vou discordar e apresento meus argumentos: o que existe hoje é uma legislação que protege quem está empregado demasiadamente, mas torna muito complicada a vida de quem, querendo trabalhar, não está empregado. Por quê? Porque a nossa legislação trabalhista engessa o mercado, tornando tanto a contratação como a demissão de um trabalhador uma operação extremamente onerosa para o empregador. Na hora de contratar, o empregador teme contratar errado, procura adiar ao máximo, porque sabe que se o empregado não se encaixar na empresa, será altamente custoso dispensá-lo. Por outro lado, mesmo tendo um empregado que não atenda satisfatoriamente o que se espera dele, o empregador tende também a mantê-lo, porque seria caro demais demiti-lo, por causa da multa do FGTS e outras despesas que incidem sobre a demissão. São duas situações que premiam a ineficiência, e podem ter certeza, no fim das contas afetam nossa economia e nossa produtividade como um todo. Além disso, no âmbito do indivíduo, aquele que poderia ser um bom empregado permanece desempregado, porque é difícil dispensar alguém para contratá-lo em seu lugar. O resultado geral é uma economia mais pobre, pouco dinâmica, e o país não se desenvolve: no final das contas todos perdem, empregados e desempregados.

Uma boa analogia a uma economia com tal regulação nas relações de trabalho, é a de um corredor que corre com as mãos atadas para trás. Até consegue se deslocar para frente, ter um “pibinho”, mas as restrições aos seus movimentos são tão óbvias, que ele acaba ultrapassado até pelos mais competidores mais atrasados. O caso da Coréia do Sul, que já citei em uma coluna anterior, não é mera coincidência, e sim um caso claro de como isso ocorre na prática, neste nosso mundo de economia globalizada.

Na próxima semana, analisaremos outra reforma ainda pendente, mas que provavelmente ficará engavetada por muito tempo, assim como a reforma trabalhista.


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