James M. Dressler
24/09/2018 | Concentração de Recursos
A vantagem de sermos velhos é que acumulamos experiências, e nos divertimos vendo propostas que apenas retomam práticas antigas como se fossem ideias novas, que já geraram tantos problemas que foram abandonadas.
A última onda que percebi, nas propostas de alguns candidatos, é a tal descentralização dos recursos oriundos dos impostos, deixando de concentrá-los (na sua maior parte) em Brasília, e mantendo-os mais próximos dos cidadãos, nos estados e principalmente nos municípios. Não interessa muito que candidatos a presidente estão propondo isso, até porque não é apenas um. Além disso, é algo que já vem sendo falado há algum tempo por diversos políticos e economistas, e, portanto, é uma ideia que já está disseminada por boa parte da sociedade.
O problema todo é que a descentralização era o estado anterior da distribuição de impostos, era assim antes que começasse a concentração dos recursos. E quando foi que ela começou? Começou fortemente quando veio a ditadura militar. E por que os militares fizeram isso? Por que a corrupção grassava por um grande número de prefeituras e estados de todo Brasil, havia desvios de toda ordem, de tal forma que era impossível combatê-la por alguém que quisesse realmente dar um fim ao problema, justamente por causa da descentralização e da impossibilidade de se controlar melhor o que ocorria em tantos lugares ao mesmo tempo.
Foi assim que surgiu a tal concentração de recursos em Brasília. Outros motivos secundários concorreram para tal, como possibilitar ao governo central redistribuir verbas para desenvolver estados mais pobres, com investimento em infraestrutura, como estradas, aeroportos, etc. Os militares acreditavam que tendo o controle da maior parte dos recursos, haveria uma maior eficiência na arrecadação e no gasto público, no que até tinham alguma razão, pois o descalabro era mesmo grande no período que antecedeu a ditadura.
Desconcentrar os recursos agora até pode parecer boa ideia, a questão é se não voltaremos ao problema anterior, que talvez seja maior do que o problema atual. Pode se argumentar que hoje temos mais transparência no gasto público a nível municipal e estadual, e consequentemente uma possibilidade maior de fiscalização pelos cidadãos. Há também outros sistemas de fiscalização dos próprios governos, em todos os níveis, que não existiam antes, ou eram precários. Verdade. Mas isso é o que parece, mas aí se lembre de todos os casos recentes de desvios descobertos em cidades e municípios, inclusive grandes capitais como Porto Alegre ou São Paulo: é desvio no tal “aluguel social”, nas merendas, nas obras da Copa, e por aí vai. Imagine quando houver ainda mais recursos só na mão das prefeituras, ainda mais as pequenas, lá no “interiorzão” do Brasil...
Nada é tão simples como parece. Sempre desconfie de soluções do tipo “por que ninguém nunca pensou nisso antes?”. Normalmente já faz tanto tempo que elas foram adotadas e abandonadas, que ninguém mais lembra ou os que poderiam lembrar-se delas já morreram.
Neste momento, mais importante do que quem controla a arrecadação e o gasto público, é que quem produz mais e gera mais riqueza tenha um retorno melhor em termos de serviços públicos. Não dá mais para um estado gerar bilhões em impostos e ficar só com 20% do arrecadado, enquanto 80% vão para Brasília gastar como achar melhor.
Problema para o próximo presidente e congresso se debruçarem e encontrarem uma repartição mais justa destes recursos, adequando as despesas a essa nova realidade.
Tarefa difícil.
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