James M. Dressler
16/04/2018 | Nós Contra Eles
Já faz algum tempo, tornou-se comum a queixa de vítimas que, durante assaltos, não basta aos criminosos subtrair bens, é comum também a agressão, como se fossem culpadas pela situação do ladrão, que roubaria apenas porque não teria alternativa. De onde saiu isso?
Vasculhando minha memória, tenho a impressão de que isso não é algo novo. Lembro-me de histórias bem antigas em que isso já acontecia, décadas atrás. Mas assim como a quantidade de crimes aumentou de lá para cá, o mesmo aconteceu em termos deste “clima de vingança” do bandido contra sua vítima, e acho que mais do que proporcionalmente ao número de crimes.
A penetração do discurso que praticamente se tornou hegemônico aqui no Brasil depois do fim da ditadura militar, de que a economia seria um jogo de soma zero, tem muito a ver com isso. Segundo esta lógica, para alguém melhorar de vida é preciso que outrem tenha sua vida piorada. De outra forma: quem está numa situação econômica mais favorável está subtraindo de alguma forma riqueza de quem está empobrecido.
O problema é que isso não corresponde à realidade. Fosse assim, ficaria difícil explicar como, partindo de uma população de 1,5 bilhão de pessoas em 1900 e chegando, em 2017, a 7,5 bilhões, portanto cinco vezes mais, a imensa maioria das pessoas tem uma vida mais longa e muito melhor hoje do que há cem anos. Fosse a economia um jogo de soma zero, seria inevitável sermos todos mais pobres hoje que nossos antepassados. A verdade é que todo o progresso econômico da humanidade foi conquistado a partir do século XIX. Durante esta fase extraordinária, que dura até hoje, a renda real per capita do mundo aumentou nada menos que 3.000%. Ou seja, na média, um ser humano ganha trinta vezes mais hoje do que em 1800! Fica claro assim que não há um jogo de soma zero.
O fato é que a riqueza é criada, a cada segundo, a cada minuto. Novos produtos, novas tecnologias, novos serviços. A inventividade humana não tem limites, sempre gerando novas ofertas de tudo que se possa imaginar, ou demandando por novas e melhores soluções para problemas antigos. É assim que a riqueza aumenta, e pelo que temos visto nos últimos dois séculos, numa velocidade bem maior do que a população. E apesar das críticas, cada vez de forma mais sustentável, até porque isso acabou sendo também uma nova demanda que, como todas as outras, acabou sendo atendida, gerando ainda mais riqueza.
Este clima de vingança do ladrão contra sua vítima, uma coisa absolutamente sem sentido, tem origem neste discurso falso do jogo de soma zero, de que o ladrão seria um excluído, e se é excluído, implicitamente alguém o está fazendo, tomando-lhe algo que por direito seria seu. Decorre daí o consequente discurso de ódio de classes, de “raças” (na realidade só existe uma raça humana), de minorias contra maiorias, de “oprimido” contra “opressor”.
Muito utilizado por políticos populistas em busca de votos, principalmente os de viés marxista, esta lógica vem dividindo o país baseado na lógica do “nós contra eles”, e o resultado não tem sido nada bom. De um país que tinha uma relativa estabilidade social, e que caminhava para um futuro melhor, depois do Plano Real e do controle da inflação, chegamos ao dias de hoje, em que parte do país quer caminhar para frente, em busca do desenvolvimento, enquanto outra acredita que o Brasil já seria rico, falta apenas é distribuir a riqueza de forma melhor, segundo seus próprios critérios que, por sinal, desprezam qualquer mérito.
Os criminosos também assimilam este discurso da luta de classes, e tendo o poder na mão durante um assalto, não é de espantar que resolvam descontar suas frustrações em seus supostos algozes. Não surpreende que isso venha se tornando mais comum, à medida que este discurso tenha penetrado mais no seio da população.
Felizmente, parece que, de uns tempos para cá, este discurso vem perdendo força, coisa que, aliás, já aconteceu no resto do mundo há mais tempo. As eleições de 2018 talvez sejam o momento em que sepultaremos de vez este discurso inconsequente.
Muita coisa se decide nas próximas eleições, mas talvez seja superar o “nós contra eles” o mais importante.
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